São um quarto para as três e estou atrasado para o médico, há duas semanas que ele não me deixar sair de casa e hoje pode ser o dia que me dê alta. Mesmo antes de sair reparo na chave com um “H” em cima da mesa... “Hmmmm... Se o médico me der alta posso ir já buscar o ITR!” Meti as chaves no bolso e saí. Quatro e meia da tarde e já estou em direcção ao local onde deixei o ITR guardado, a radiografia não acusava nada! Chave na mão, cheio de ansiedade e começo a lembrar-me, o carro está parado há vinte dias. Será que arranca? Talvez nem bateria tenha. Provavelmente vai se sentir contrariado a arrancar, a última vez que estivemos juntos foi no último track day das Superdrivers e aquilo foi um pouco hardcore! Discutir travagens com o “Fui”, dois depósitos de sem chumbo 98 e um RE540S praticamente novo para o lixo. Só tive tempo de voltar a montar os pneus de estrada e descartá-lo no seu poiso habitual, se fosse eu tinha ficado ressentido. Os discos de travão estão todos ferrugentos e tenho quatro caracóis colados ao capot, logo que eu me meter na estrada eles vão saltar! Rodo a chave e o painel ilumina-se, aquele ruído característico dos motores de arranque de muitos Hondas e o motor começa a trabalhar em menos de um segundo. Ouço o escape a borbulhar como se estivesse cheio de água, e deve ter concerteza com o tempo que ficou à chuva. Uns rateres depois e volta ao normal, depois dos últimos track days acho que o miolo da panela final de origem desapareceu. A primeira coisa que noto é que o pedal de travão continua duro, as pastilhas DS2500, os tubos de travão Goodridge e o líquido de travões Ferodo DOT5.1 aguentaram bem o esforço do track day, é a primeira vez que continuo com o pedal duro depois de um track day. O Sput pode comprová-lo porque da última vez que andou com o ITR queixou-se logo de um pedal esponjoso, pudera! Os travões tinham sido submetidos a um track day há pouco tempo. Engreno primeira e instantaneamente sou recordado porque os engenheiros da Honda andaram a perder horas com o seleccionador de velocidades, o manuseamento da caixa é tão directo que até podemos jurar que é a nossa própria mão que engrena o carreto. Ponto de embraiagem, sempre difícil neste carro, e a passagem para segunda sempre brusca e que muitas vezes me causa embaraço no tráfico. Muita boa gente já deve ter achado que tirei a carta na farinha Amparo ao ver-me passar de primeira para segunda no trânsito, alguém uma vez me disse que as duas primeiras velocidades estavam no limiar do que é aceitável para o dia-a-dia. As minhas costas sentem-se apertadas e a sinto uma certa impressão na espinha como se ela estivesse a absorver todas as irregularidades da estrada, sim é mesmo um ITR! Conforto para quê? Suspensão firme e aderente e as belas baquets Recaro para ficarmos com as nádegas bem assentes. Vou na IC19 e o som ensurdecedor do escape, a falta de material de isolamento, o ruído dos pneus radiais e aquela impressão horrível na espinha já tinham enlouquecido o condutor habitual, mas eu? Eu estou a adorar! Estou a rolar devagar, além de estar a chover e eu não conhecer os novos AVS que tenho no eixo dianteiro, não quero puxar muito pelo carro por estar tanto tempo parado. Ainda por cima depois de um track day. Quando chego à segunda circular e vejo que por lá a chuva já parou há muito tempo decido exercitar o pé direito. De quinta para terceira e o ponteiro das rotações começa a subir a uma velocidade pouco comum, quando passa as 6000rpm sinto o autoblocante à procura de tracção com a transição para as cames de alto perfil, quase a chegar às 9000rpm e está na altura de passar para quarta velocidade. É agora que os sacanas dos caracóis vão voar fora do capot! Eu concordo que o turbo é uma solução eficaz e simples para se antigir potências elevadas e que os Diesel também conseguem números espantosos, principalmente a nível do binário. Aliás como todos sabem existem três projectos turbo no DO (RocketChef, Evil S14 e Midtown S13) que um dia destes vão passar a ter que pedir autorização à torre de controlo do aeroporto da Portela para saírem de casa. Quem já os viu a andar sabe do que eu estou a falar. Até o Diesel do RocketChef já me vez mudar a opinião sobre os Diesel, por vezes temos que reconhecer que acabamos por ser críticos demais com os petroleiros e que binário e baixos consumos não podem ser assim tão maus! Mas isto para dizer que não há nada como um atmosférico a subir pelas rotações acima, pode não ser o mais potente ou o mais económico mas é o que dá mais sensações e deixa mais sorrisos em qualquer entendido na matéria. E em pista por vezes chegam a ser mais eficazes do que certas aplicações turbo. Infelizmente a saída para o estádio da Luz está próxima e vou ter que reduzir para terceira outra vez, infelizmente não! Porque agora vem uma curva bastante divertida, uma direita infinita e sempre com o mesmo ângulo. Os AVS estão aprovados, a frente colou bem e o autoblocante ajuda a manter a tracção no chão. A traseira começa a escorregar mas não me assusta nem me apanhou desprevenido, como já vem sendo hábito a extrema rigidez do chassis avisou-me atempadamente de todos os movimentos do chassis. É o que eu adoro mais neste carro! Torna o condutor mais banal como eu num verdadeiro piloto de corridas e temos a sensação de estar numa competição constante com a estrada. Aponto a frente para a saída da curva e vejo que o sinal está vermelho, é pena, se estivesse verde podia mais uma vez abusar do autoblocante e acelerar a fundo mesmo antes de ter saído completamente da curva. Acabou-se a viagem e estaciono para ir para casa. Ah! Os caracóis continuam colados ao capot, são resistentes os nossos amigos ranhosos. A minha mãe convenceu-me em retirá-los com cuidado e pousá-los na relva, eu estava mais a pensar em fazê-los voar com a pistola do elefante azul...